Sempre se pensou que o processo que permite utilizar a luz do sol para produzir energia, conhecido como fotossíntese, era exclusivo das plantas e de outros organismos autotróficos. Até que uma investigadora da Universidade do Maine (EUA) descobriu uma lesma-do-mar com um código genético que lhe permite executar a mesma operação.
A transformação de energia luminosa em química é, sucintamente, a forma de produzir oxigénio a partir do dióxido de carbono. Chama-se fotossíntese e é uma operação básica nas cadeias alimentares, pois sem as substâncias orgânicas que assim são proporcionadas a todos os outros seres vivos, eles não sobreviveriam. Ser fotossintético ou não ser, é essa a questão entre os seres autotróficos, capazes de produzir o seu próprio alimento, e os heterotróficos, que deles dependem.
Entre os seres fotossintéticos encontram-se as plantas verdes, algumas microalgas e bactérias, e, a partir de agora, também a lesma-do-mar Elysia chlorotica.
Esta lesma-do-mar mede cerca de 3 centímetros e tem a aparência de uma folha gelatinosa de cor verde. É um molusco gastrópode marinho, da ordem dos opistobrânquios, e encontra-se ao longo da costa este dos Estados Unidos, entre as águas da Nova Escócia e da Flórida.
Já era conhecida a sua relação especial com as algas que ingeria. Mary Rumpho, investigadora da Universidade do Maine e especialista nesta lesma-do-mar, tinha descoberto que, quando ingeria algas, a Elysia chlorotica assimilava os cloroplastos (células onde se processa a fotossíntese) destas e armazenava-os nas suas próprias células. O cloroplasto é rico em clorofila, o pigmento que dá a cor verde às plantas e que é crucial para a fotossíntese. Os estudos efectuados por Mary Rumpho permitiam saber que aos juvenis de Elysia chlorotica bastava ingerir algas durante duas semanas para poderem sobreviver o resto do seu único ano de vida sem comer. No entanto, a investigadora continuava sem perceber como é que os cloroplastos persistiam nas células da Elysia chlorotica, visto que no seu ADN contêm apenas 10% das proteínas necessárias e os restantes genes estão no próprio ADN das algas de origem. Estaria então a chave deste mistério no código genético da lesma-do-mar?
Ao sequenciar o código genético da Elysia chlorotica e o da sua alga preferida, os cientistas perceberam que um dos genes vitais da alga estava presente na lesma, inclusivamente na mesma posição sequencial. Embora ainda não se saiba como foi possível, o que é certo é que a lesma “roubou” este gene à sua própria comida. A relação de simbiose que assim é estabelecida não é em si um fenómeno inusitado, mas destaca-se pela longa duração, pois chega a durar 10 meses.
A equipa de Mary Rumpho acredita que as algas são processadas pelo sistema digestivo da lesma-do-mar, o gene é adquirido tal como os cloroplastos e depois incorporado no ADN da lesma, permitindo-lhe produzir as proteínas de que os cloroplastos precisam para fazer a fotossíntese. Falta ainda encontrar explicação para a forma como os genes são activados desde o interior das células da lesma-do-mar.
Mas há mais: ao contrário do que seria de esperar, também foram encontrados os genes da alga nas células sexuais da Elysia chlorotica, o que significa que os cloroplastos funcionais são passados de geração em geração.
Fonte: Animalia.pt